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quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Chapter III - Work

5:43h
Isso significa que o relógio vai despertar mais duas vezes ainda, uma as 5:47h e outra as 5:51, que é a hora de levantar... Sempre tive mania de colocar horário quebrado no despertador, desde pequeno, minha irmã falava que eu devia ter algum problema, na verdade ela não sabia, mas eu tinha vários.
Continuando com meu algoritmo matinal, levanto, coloco roupa de malhar e desço para a academia do condomínio, não tem muito equipamento mas não preciso me locomover, o que é ótimo, teria que acordar quase uma hora mais cedo se quisesse freqüentar uma academia fora, e para quem me conhece sabe que sono é sagrado para mim.
Para minha surpresa, a Júlia chegou à academia 5 min depois que eu – Com uma cara de sono tão ruim quanto a minha, mas essa é vantagem das mulheres, mesmo assim ela estava bonita. Coincidência? Talvez.
- Bom dia Júlia, caiu da cama hoje?
- Bom – Um bocejo – dia Bruno, como é que o senh... você está?
Ela sempre me chamava de senhor, eu sempre reclamava, ela dizia que era porque estava acostumada a chamar os clientes de senhor, normas da loja, salvo quando o cliente pedia o contrário.
- Bom mesmo, pensei que ia ter que executar aquela cláusula do nosso acordo.
- Ah, é mesmo, tinha até me esquecido, mas não vai ser dessa vez...
Ela sempre me chamava de senhor, daí combinei com ela que cada vez que ela me chamasse de senhor ela teria que me pagar um lanche, na verdade quando falei isso esperava que ela me chamasse de senhor na mesma hora e me encarasse com os olhos cerrados com aquela expressão de quem fez de propósito, isso nunca aconteceu, mas pelo menos valeu a tentativa e a diversão.
- Mas me diga, eu venho aqui todos os dias nesse horário e nunca vi você, resolveu malhar agora?
- É, na verdade foi a dona Maria que ficou me atazanando, dizendo que eu andava muito sedentária, mas poxa, eu já trabalho de pé o dia inteiro, por isso fico cansada de noite... Mas ai ela veio falando que eu ficava cansada porque não fazia nenhuma atividade física, e tinha que ser logo cedinho para funcionar.
Dona Maria, ela sabe que eu venho aqui esse horário, quando chegar em casa vou descobrir se ela armou de propósito ou foi apenas coincidência.
- Olha, eu concordo com a dona Maria, atividade física sempre é bom, eu sinto falta de praticar algum esporte, mas malhar pelo menos me deixa mais disposto, você devia continuar, além do mais que é sempre bom ver um rosto bonito, aqui só dá velho pela manhã...
Ela corou, colocou um sorriso no canto do rosto e abaixou a cabeça enquanto me olhava com o canto do olho, adoro expressão corporal, dizem mais que muitas palavras, mas nesse caso era diferente, apenas uma diversão.
6:50h
Minha rotina de 45 minutos de exercício completa, voltar para casa, tomar banho e café, também aproveitar para conversar com a dona Maria sobre a visitante de hoje na academia.
Eu gosto de tomar banho bem quente, depois no final, antes de sair, eu abro bem o chuveiro e a água fria com pressão batendo no corpo, é ótima a sensação, parece que revigora as forças.
Quando me troquei dona Maria já estava com a mesa pronta, e ainda de costas, enquanto lavava alguns itens na pia falou:
- Bom dia, como foi à academia hoje? Alguma novidade?
- É dona Maria, depois pergunta por que te chamo de Maria, a louca...
- Ah, sempre achei que vocês fariam um ótimo casal, sem contar que na atual situação dos dois, a fase da vida que se encontram, um faria um bem enorme ao outro!
É o que muitos dizem, é quase um contrato, os dois se beneficiam então deveriam ficar juntos, eu não concordo com isso, porque ela pode até estar certa de começo, mas depois que sentimentos entram na situação, tudo fica mais complicado, e a Júlia é uma boa menina, não merece sofrer por um cara que não gosta dela o suficiente.
- Eu já te disse que gosto muito da Júlia, mas só como amigo, nunca daria certo, ela escolheu uma vida diferente da minha, e espero que seja feliz, um não suportaria certas escolhas que outro fez, nunca daria certo.
- Ah, você sempre usa a mesma desculpa, às vezes me pergunto se você é tão inteligente assim mesmo como todo mundo diz! Você se preocupa de mais e esquece de ser feliz, se não der certo, não deu, pronto! E quanto ao fato dela sofrer, você não pode ser egoísta ao ponto de não permitir que as outras pessoas não cometam seus próprios erros, afinal de contas, como foi que você aprendeu? As pessoas também tem que errar para aprender, sabia? Você não é tão diferente quanto se julga ser, você é normal como qualquer um outro, talvez um pouco mais esperto, mas é só.
Vez ou outra ela faz isso, desembesta a falar e me dá um sermão, não gosto muito disso, mas sei que ela fala de coração porque gosta de mim, esse é o único motivo dela falar, querer o meu melhor, igual mãe, então nunca me chateio.
- Seja honesta comigo então, a senhora está armando para cima dos dois ou já sabe algo da parte dela?
- Por quê? Se eu souber você vai tentar?
- Não foi isso que eu disse, só quero saber, sou curioso, sabe?
- Não, não sei de nada da parte dela, mas posso dar umas indiretas...
- Vamos fazer isso, se ela continuar na academia, quem sabe depois de uns dias as coisas não aconteçam naturalmente com os dois se falando todo dia?
- Aiai, você sempre escolhe o método natural, assim é muito lento!
- No final sempre dá certo, não dá?
- Ok, ok, e anda logo que senão vai chegar atrasado! Você é chefe e tem que dar exemplo!
- Ok, beijão e bom dia!
- Tchau querido.
Eu já falei que a dona Maria é fantástica? Gosto muito mesmo dela.
Hora de ir trabalhar, trânsito leve hoje, não vou demorar mais que quinze minutos, perfeito!
Eu tenho minha própria empresa, trabalho com computadores, desenvolvo softwares, tenho alguns aplicativos com clientes fixos e vivo criando coisas novas. Eu trabalho no setor de criação, mas tenho uma equipe pequena que passa o dia todo fazendo atualizações nos trabalhos antigos, tenho nove funcionários e um estagiário.
No meu trabalho funciona assim, trabalho no mínimo oito horas por dia, no máximo dez, salvo exceções. Vi uma vez em um filme um cara que dividia o dia em unidades de tempo, eu gostei disso, cada unidade de tempo minha tem 30 min, minha meta é gastar no máximo duas em cada atividade. Foi difícil explicar isso para minha secretária, primeiro ela não entendia, depois me achou louco, mas depois aceitou, não queria alguém nem muito velho nem muito novo na posição, acabei optando pela Laura, 32 anos, mãe de dois filhos, um de nove e outro de onze anos, dois meninos levados, assim como todos deveriam ser, ótimas crianças.
- Bom dia Bruno, reservei sua unidade livre logo pela manhã para o senhor se preparar para uma reunião com aquele novo cliente, ele vem as 8:30h, duas unidades para a reunião?
- Bom dia, ótimo, não sei o que faria sem você Laura, já está começando a prever meus movimentos, você não sabe programar não?
Ela riu e virou as costas, eu poderia usar alguém como ela na minha equipe, perco mais tempo explicando minhas idéias do que trabalhando com minha equipe, mas mesmo assim ainda acho ela muito boa na função dela.
Adoro essas reuniões, cliente novo, eu entro na sala apenas com uma lapiseira e um bloco de folhas sem pauta, o cliente vai falando e eu vou escrevendo, no final tenho um esboço, que vou acertando até chegar em algo de agrado do cliente, sempre tento escapar dos meus softwares prontos, porque o que eu gosto mesmo é de criar.
Não faz sentido eu explicar a reunião aqui, mas tudo foi bem, consegui o serviço e o cliente saiu animado do escritório, nem todos saem assim.
- Laura, chame o Ricardo para mim, por favor.
O Ricardo é meu homem de confiança aqui dentro, conheci ele no metrô cinco anos atrás, ele estava lendo um livro didático e eu estava querendo comprar o livro, perguntei se era bom, e puxamos assunto. Encontramos-nos um ano depois em uma licitação de lados opostos, montamos um consórcio e ganhamos juntos, ele era funcionário da empresa dele, então chamei para vir trabalhar comigo. O serviço dele é basicamente ser meu amigo, sempre que travo em um “dead-end” é com ele que converso para abrir minha mente, ele é o único que trabalha comigo na criação, mas ele também realiza trabalho técnico.
Hora do almoço, sai para almoçar com o Ricardo, e no restaurante que fomos tem um sistema de fidelidade, toda refeição você ganha uma carimbada em um cartão, doze carimbos valem um almoço grátis, hoje completei minha cartela, isso significa que o Glauber acabou de ganhar um almoço grátis.
Hoje também é o aniversário do estagiário, happy hour por minha conta, a galera fica feliz, eu ganho moral, todo mundo sai no lucro. Somo todos muito próximos aqui na empresa, procuro conversar e ser amigo de todos, acho que conduzo bem a situação, mas sei que se estive fazendo algo errado também serei o ultimo saber, espero que esteja certo sobre estar conduzindo bem a situação.
A Laura nunca vai para o bar, mas ninguém reclama, é a única casada e que tem filhos, todos são solteiros, o estagiário quando entrou tinha namorada, mas não durou muito, mas desconheço os motivos. Dez homens em um bar, tudo bem que eu não bebo, mas quando entra álcool na história, pode ter certeza que vamos falar muita bobeira, vai ter um ou outro procurando azaração e todo mundo vai estar de ressaca amanhã, em plena quinta-feira, mas faz parte.
17h
Isso significa que acabo de entrar na minha ultima unidade de tempo do dia, nada que eu comece agora vou conseguir terminar, quando acontece isso eu dou uma volta pelo escritório, sempre tem um querendo conversar, e quando digo conversar, não falo só de jogar papo furado, ainda que as vezes eu faça isso, mas normalmente eu dou uma volta e olho para cada um em sua divisória, parecem abelhas operárias. Abelhas operárias porque o layout do escritório tem divisórias que montam duas mesas hexagonais, igual uma colméia, dizem que é o ambiente de trabalho mais otimizado que existe, ainda que não se aplique ao meu ramo, gostei da piada, chamamos o Jorge de zangão da colméia, porque ele sempre está bravo, ainda que isso não tenha nada a ver com o significado real da palavra, pois o zangão não trabalha, totalmente diferente do Jorge.
Eles já me conhecem, sabem que podem confiar em mim, então quando precisam conversar apenas esperam que eu olhe e me olham de volta, me chamam com os olhos. É interessante que esse é um código que todos nós usamos, mas nunca combinamos.
E olha lá se não é o Pedro com quem eu vou conversar hoje... Sabe aquele aluno quando está colando que fica olhando para o professor e nem pisca, daí quando o professor olha ele desvia o olhar? Mais ou menos o que o Pedro está fazendo agora, aposto que ele fez algo errado e está com medo que eu descubra, como se eu fosse do tipo bravo.
- E ai Pedro, como é que vai?
- Bem... BEM! Chefim...
Eles me chamam de chefim, com exceção da Laura e do Ricardo que me chamam de Bruno, eu costumo dizer que não tendo intenção de ofender pode chamar do que quiser...
- Aconteceu alguma coisa? Parece meio estranho...
Não que o Pedro seja o tipo de pessoal normal, ele poderia ser o logotipo da empresa, sabe aqueles caras que quando você vê já enxerga um nerd? Falta apenas colocar um suspensório, já usa óculos, aparelho nos dentes e camisa xadrez, mas é um grande profissional. O Pedro também é o atrapalhado da turma, o pessoal apelidou ele de Murphy por aqui, pois se uma coisa pode acontecer errado certamente vai acontecer com ele, o que faz com que seja bom sair com ele, pois você sabe que nada vai acontecer com você, ele é quase um pára-raios de acidentes.
Eu lembro de uma vez que fomos jogar bola, ele foi beber água, daí pegou uma daquelas garrafas d’água de 1,5 litros e foi encher o copo, mas quando foi beber prendeu a garrafa debaixo do braço, quando foi dar o ultimo gole inclinou a cabeça de mais e acabou abrindo um pouco o braço, derrubando a garrafa no chão. Quando foi pegar a garrafa do chão e a ergueu, viu que o fundo tinha partido com a queda, e estava vazando toda a água, para evitar que vazasse tudo ele virou a garrafa de cabeça para baixo, mas ele tinha esquecido de colocar a tampa na garrafa, e continuou derramando a água e não percebeu, quando começamos a rir ele reparou e tomou um susto, inclinando um pouco garrafa d’água e molhando todo a camisa e shorts na altura da cintura, dando a impressão de que havia mijado nas próprias calças. Uma cena fantástica, que só poderia ter sido protagonizada pelo nosso amigo Pedro, qualquer outra hora eu conto um nova história dele, ele possui várias.
- Nada não, tudo em ordem.
Eu quase pude ver a saliência na garganta dele engolindo a saliva como se tivesse passando uma pedra por ali. Os olhos arregalados com as pupilas levemente dilatadas e as sobrancelhas retas, sem contar que ele mexia os braços como quem arruma a mesa, mas parecia que tinha acabado de ter uma paralisia e seus braços estavam duros, eu dei uma risada de leve, como aquelas que agente dá quando se lembra de uma cena engraçada, o garoto é uma comédia, ele tem 24 anos e trabalha comigo desde o ano passado, era meu estagiário antes.
- Tem certeza? Absoluta?
- Ah, então, eu estou fazendo aquelas atrapalhadas de novo, não tô? Igual cachorro quando faz bagunça e se entrega sozinho?
- Yeap!
- Então, queria dizer que foi sem querer, eu jamais teria feito isso de propósito, o senhor sabe que eu levo o trabalho a sério e...
- Desembucha rapaz, fala logo o que aconteceu, que eu não consigo mais ficar sério, fale antes que eu comece a rir... E o Senhor sabe que você é um bom menino, aposto que você faz todas suas orações e Ele vai ser generoso com você.
Tinha certeza que vinha mais uma daquelas atrapalhadas.
- Hã, me desculpa, esqueci que não gosta que chame que eu te chame de senhor, isso também não vai mais acontecer.
- Trinta segundos para falar antes que eu chame a atenção de todo mundo e faça você contar na frente de todos...
- Ah, sim, ok, pois bem, como ia dizendo, aconteceu o seguinte, eu tenho esse amigo Marcelo, da época da faculdade, uma figura o moleque, você ia gostar dele, tenho certeza, ele até mandou um currículo aqui uma vez, talvez você se lembre dele.
- Pedro! Foco Pedro, foco!
- Ah, desculpa... então, o Marcelo, ele sempre me manda e-mails, e hoje ele mandou um e-mail assim, eu até encaminho para você caso você queira ver para saber que eu não estou mentindo.
Ai, eu odeio quem fica rodando em torno de uma história e se prende a fatos insignificantes para a história principal, mas sempre fui cercado de pessoas assim, minha mãe é um exemplo, detalha até a cor da camisa da prima da vizinha da mulher que tava na rua quando o fato aconteceu.
- Hum...
- Então ele me mandou um e-mail hoje de manhã, e como sempre, quando eu ligo o computador eu abro o navegador e deixo as abas carregando enquanto eu checo meu e-mail, e nisso eu li a mensagem dele, dizia que era para eu checar esses novos sites de stream de vídeo, desses que carregam no site e não tem que baixar para o computador, tinham três links, eu nem li, apenas mandei abrir os três em novas abas do navegador e continuei a ler os outros e-mails, mas daí que aconteceu, quando eu mudei as abas, eram três sites de vídeo pornô...
Eu sabia, tinha que ser uma atrapalhada daquelas... Eu já estava gargalhando essas horas.
- Eram bons os vídeos pelo menos?
- Ah, não sei, eu nem vi, fiquei desesperado, quando vi aquele sacanagem, tinha muita gente em cima da mesma cama, nunca tinha visto daquilo, sem contar que apavorei, apertei todas as teclas tentando fechar o vídeo, mas você sabe que quanto mais desespero agente fica menor parece ficar o botãozinho de fechar a janela, mas eu acho que ninguém viu não.
- Bom, ninguém reclamou até agora.
- Eu estava com medo de você ter visto no histórico do servidor e achar que eu estava acessando esses sites daqui do serviço. Bom na verdade eu acessei, mas foi sem querer.
- Relaxa rapaz, foi sem querer, mas cuidado da próxima vez, se alguém tivesse visto isso, principalmente a Laura, poderia gerar um constrangimento muito grande em ambas as partes.
- Ok chefim, isso não vai acontecer de novo não, hehe.
Lógico que eu não ficar por ai, voltei para meu escritório e entrei no log do servidor e vi que horas o site foi acessado, 8:13h, daí fui no arquivo das filmagens de segurança e olhei a filmagem do horário, queria ver a reação dele. Foi muito engraçado, sabe quando alguém cai na rua e levanta rapidinho olhando para os dois lados procurando se alguém viu a cena? Foi quase isso, só que ele olhava freneticamente para os dois lados checando se alguém tinha visto o site no monitor dele, somados ainda as mãos que tentavam fechar o vídeo, ele ficava com a mão esquerda apertando repetidamente o quer parecia ser Alt+F4 enquanto a mão direita parecia boba, não sabia se ia para o teclado ou para o mouse, em uma indecisão cômica, mais uma atrapalhada para a coleção do Pedro.
Fim do dia, pelo menos dia de trabalho, agora é juntar a galera e ir para o bar comemorar o aniversário do estagiário, coisa rápida, afinal de contas ele vai comemorar com a família e outros amigos mais tarde ainda, até me convidou, mas apenas por educação, disse que tinha outros compromissos, seria chato aparecer em um evento cheio de amigos dele e deixar ele preocupado em me dar atenção por ser o chefe no lugar de se divertir com a galera.

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